sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

CARIMBÓ EM TODO CANTO

Aos quatro cantos do mundo venho dar ciência do quanto importante é o Carimbó para o povo marapaniense – e como eles mesmos dizem: a todos que adotaram Marapanim e o carimbó como ritmo de vida.

Nos dias 4, 5 e 6 nossa querida “Mapara” – para os íntimos – realizou mais uma edição do Zimbarimbó (Zimba é festa, no melhor estilo linguístico daquele lugar; e o sufixo é o óbvio demais, certo?). Fabuloso encontro de um único ritmo: o Carimbó – de Mestre Lucindo, Pedro Roberto e Bento, o homenageado nesta segunda edição; assim como foi o ritmo que cadenciou e ainda faz balançar a vida de vários mestres que ao longo de outros tantos “zimbas” nunca deixarão de ser lembrados – sem que para isso precisem morrer: “Deus nos livre!”

Quanto ao encontro de um único ritmo, trata da integração de tocadores de carimbó, na ocasião de festejos, como o “Zimba”, em que os de casa recebem outros carimbozeiros de municípios vizinhos, no caso, com maior frequência, os vindos de Curuçá.

O Zimbarimbó está, mesmo como caçula que é, vale ressaltar que já mencionei ser a segunda edição apenas, se consolidando como um dos eventos de maior relevância na forma de ordem da sociedade civil organizada; pois vem sendo fruto de uma série de conversas, articulações, parcerias, entraves, acertos, confusões, retaliações, adequações, rachas e readequações. É isso mesmo. Não dá pra acreditar que um evento com sua magnitude e esplendor, seja ele qual for, seja só flores. Até porque são algumas dessas divergências naturais, digo, culturais, as motivadoras das ações; principalmente aquelas que são respostas a quem duvida de nosso potencial – o que passa bem longe do que acredito ser o ideal: não precisamos provar nada a ninguém para nos sentirmos bem.

Foram três dias de muita festa ao povo de lá e aos que por lá passavam, que acabaram ficando. Marudá? Crispim? Que nada! Naquela ocasião perderam a prioridade para o ritmo que o mundo conhece e que é a cara do Pará.

Mas de que vale o orgulho do Estado e das demais esferas administrativas do poder público quando in loco pouco ou nada se faz para garantir a manutenção daquele ritmo cadenciado que demonstra de forma tão pulsante a mistura das raças – corpo curvado, pés descalços e instrumentos rústicos feitos de insumos naturais, da herança indígena; o gingado e requebrado dos corpos a se insinuarem, e a cadência rítmica dos curimbós a lembrar os atabaques africanos; e as posturas nos giros com braços ao alto, resquício da colonização europeia na formação cultural do Brasil. Se bem que na “hora do bem bom” lá no Bom Intento ninguém sequer ligou ou liga pra isso. Bom mesmo é ver a contradição entre a poeira que sobe e o suor que desce.

Carimbó em todo canto. Foi assim que viveu a “Borboletinha do Mar”. Que maravilha foi chegar àquela cidade e ser recepcionado por grupos que tocavam, cantavam e encantavam, desde a guarita (pórtico de entrada da cidade) até as esquinas, barracões, quintais; e, para não perder o costume, logo após o almoço, embalar-se na rede armada na varanda ao som de adivinhem o quê? Vi muito isso por lá – e é sempre, mas pouco visível.

Lembro-me que numa de minhas idas à “Terra do Carimbó”, na ocasião em que eu e meu camarada Professor Favacho (o Ivanilson, pois Favacho em Marapanim é como carimbó, em todo canto tem), juntamente com os grupos e associações que pensaram o Zimbarimbó, propus o projeto “Carimbó em Todo Canto” sob três conotações bem distintas e ricas na plurissignificação. 1ª – Carimbó em todo canto (= esquina) da cidade, numa manifestação de “ensaio aberto” a permitir que as famílias possam ter acesso sempre, não só nas rádios, mas ali bem pertinho, no bairro e ao vivo; 2ª – Carimbó em todo canto (= do verbo: cantar) como gênero musical a ser aprendido e entoado por todos de modo a garantir a perpetuação do ritmo; e 3ª – Carimbó em todo canto (= qualquer lugar) para quem quiser “conhecer, amar e defender”, de modo a consolidar um “selo” que leve (no bom sentido, na lembrança) não só a cultura marapaniense, mas a essência do povo gentil, alegre e hospitaleiro que se esbalda nas letras simples do muito que as canções contam.

Daí, minha felicidade não mais se conteve, pois o mérito do carimbó é tão presente na vida desse povo do Pará que pude saber do: Zimbarimbó (festa de carimbó), Boarimbó (no dia 20/12 na vila de Boa Esperança, em Marapanim), Fest-rimbó (em Santarém Novo, com a Irmandade de São Benedito, nos dias 19 e 20, quem duvida que estarei lá?), o Folclorimbó (realizado no mês passado, em Curuçá), Festival de Carimbó de Marapanim: o canto mágico da Amazônia (nos dias 13, 14 e 15, realizado pela Amatur), Carnarimbó (ao estilo dos que integram os festejos de Momo à cultura local), Carimbolada (hoje, 08/12, no Barracão do Conjunto de Carimbó Flor do Mangue, no qual o anfitrião será o Mestre Branco, a partir das 09h até o sol raiar, realizado por seis grupos que agora integram a Liga Independente de Carimbó de Marapanim, mais um movimento organizado a contribuir com a propagação do ritmo-vida da gente), com as presenças do amigo artesão Caíto e de seu rebento kauê, 2 anos, que é ninguém menos que o pequeno multi-instrumentista e dançarino “príncipe do carimbó”.

É assim mesmo: “é carimbó pra cá / é carimbó pra lá”; e não por isso apenas, aliás, por tudo isso, é que devemos nos fazer ecoar no registro do Carimbó como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro. Diga sim, eu quero!

Por fim, um de meus lamentos, e sei que os bons filhos de Marapanim irão compreender, se deu pelo fato de ao exaltarmos o carimbó, no que seria o seu “berço” não dá para não lembrar a recente perda do Mestre Verequete, que nada tem a ver com o fato de que outros nomes que não somente o de Lucindo seja lembrado e aclamado como Rei do Carimbó, como também o é o Pinduca. O mérito deve ser reconhecido, pode não ser aceito, o que é do direito de qualquer um que assim pense, mas suas relevâncias centraram-se na capital de modo que daqui escoa toda e qualquer produção para o restante do país e do mundo. E o Mestre Verequete, a efeito de informação, nunca cantou uma música sequer que não fosse de sua autoria; diferente de outros, que, justamente, por conta disso provocaram uma ciumeira besta sobre aquele que na sua simplicidade, tal qual os Mestres: Pedro Roberto, Cantídio, Bento, Lucindo, Nego Uróia (Curuçá), Amuré, Josimar, Manelão (Santarém Novo), Otoniel e Pelé – que aliás lamentei muito não o ver com sua irreverência nos palcos do Zimba, não como ele gostaria, junto ao seu Flor da Cidade.

Em fim, justiça seja feita, uma salva de curimbós ao Mestre Verequete e a todos os mestres carimbozeiros do Pará. E vida longa aos “zimbas”.


Alci Santos
Professor de Língua Portuguesa e Contador de Histórias
professorsantos@bol.com.br

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